quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Com funcionamento de cozinha, Camefe perde ares de instituição e garante atmosfera caseira

 O cheiro de tempero vai aguçando o apetite. Ainda fumegante, o almoço a ser servido: arroz, feijão, almôndegas e macarronada. Sem contar a salada crua de cenoura e tomate. Para acompanhar, suco natural de melancia, já aos pedaços sobre a pia, ao lado do melão, reservado para a sobremesa. Essa é uma cena familiar comum. Desta vez, num espaço de carinho e atenção, que contudo não tem como centro as relações interpessoais de consagüinidade. Ela se passa nas dependências do espaço de acolhimento Casa Menino Felipe, a Camefe.
 Aliás, espaço para preparo de refeições não é privilégio da Camefe, o mesmo também ocorre na Casa de Acolhimento Feminina. O incentivo à criação de características ligadas ao imaginário familiar vem sendo a orientação das casas de acolhimento da Prefeitura, rol do qual faz parte a Camefe, com crianças de até 11 anos e 11 meses. O que se quer é que as crianças se sintam em casa, com tudo aquilo a que têm direito, conforme a diretriz da secretária municipal de Cidadania e Inclusão Social, Karina Cruz Gonçalves. "Crianças e adolescentes vão parar em um abrigo exatamente porque tiveram seus direitos ameaçados ou violados", lembrou.
 Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), isso inclui: aqueles que perderam seus pais, foram abandonados, são vítimas de maus-tratos físicos e ou psíquicos, de abuso sexual ou de negligência, passam por carências materiais e/ou psicológicas; ou são antigos moradores de rua que estão com dificuldades ou impossibilitados de retornar à família.
 Um dos técnicos de promoção social da Camefe, Maykon Hendrix Freire falou de medidas implantadas no local com efeitos positivos. "Sentindo previamente o aroma da refeição, a gente observa que a criançada vem se alimentando com mais gosto". Essa é também a avaliação das três merendeiras da Prefeitura que prestam serviços na Camefe. Simone Barbosa e Maria Cidália Lima Cerqueira, que se encarregavam do almoço durante a manhã concordam de pronto.  Antes as porções vinham prontas, e o paladar não era de antemão estimulado, de acordo com ele. “São cinco refeições diárias com cardápios diferenciados para o almoço e para o jantar”, disse.        
 Casa vazia - As irmãs V, de 10 anos, e R, de 9 anos, rondam as imediações, uma de patins e outra, num corre-corre, que ora ganha ora perde mais adeptos mirins. Quem visita a Camefe a sente vazia. Hoje seis meninas e cinco meninos habitam provisoriamente o local, que já chegou a ter mais de 20. Para a sensação também contribui o fato de ninguém permancer ali o tempo todo.
 Fora a escola, a meninada tem uma série de programações. No Plano de Cuidados, as atividades podem ser conferidas por qualquer pessoa que vá até lá. Indicam destinos variados: brinquedoteca, Acessa São Paulo (para usar a internet); biblioteca, passeios pela comunidade, jogos diversos, vídeos, narração de histórias. Esta última tem sido empreendida com toda a técnica, conforme contou Maycon Freire. “Os monitores fizeram curso de contação de histórias, além de capacitação sobre abrigamento”, disse. Treinamentos variados para servidores também tem sido implementados na Camefe.  "Esses treinamentos incluem cuidadores da outra casa também, além dos assistentes sociais e psicóloga", acrescentou, referindo-se a Casa de Acolhimento Feminina. 
 Completou: “Estamos fazendo um curso de zooterapia, com alunos do curso de Psicologia da Unip e que conta com o auxílio de uma veterinária da USP de Pirassununga". A idéia é usar a cadela que vive na casa, incentivando os cuidados das crianças para com ela. A interação deverá estimular-lhes a capacidade afetiva. "Fada Princesa ou Princesa Fada é como as crianças a chamam, ainda não existe um consenso entre elas", explicou.     
 Referência - Outra mudança já em prática é no sentido de que as crianças devem ser cuidadas sempre pelo mesmo grupo de monitores que se revezam em turnos de 12 por 36 horas. Esses monitores desempenham o papel de responsáveis diretos, acompanhando as atividades entre as quais figuram: lição de casa, repouso à tarde, passeios. São ao todo 15 técnicos. A freqüência das relações com as mesmas pessoas deve garantir a constância da sensação de amparo por parte da criança.
 Para manterem-se informados, tudo o que diz respeito a cada criança é anotado num diário individual. Lá podem ser lidas descrições de fatos corriqueiros e de comportamentos inesperados. Assim se lê num deles: “K entrou de roupa e tudo debaixo do chuveiro”. Ou em termos breves: “K teve consulta médica na casa da Esperança”. Maycon Freire explicou que a menina é deslocada até este local pelo fato de ser autista e precisar de cuidados especializados. Conforme afirmou, as demais crianças da Casa são visitadas minimamente uma vez por semana por médico da Prefeitura. Duas enfermeiras dão plantão no local, de acordo com ele.
 Apadrinhamento - As visitas de pessoas interessadas em apadrinhar internos também são incentivadas. A eles é permitido que levem as crianças para passear ou para passar fins de semana fora da Camefe. Embora o primeiro passo para quem queira tornar-se padrinho seja o contato direto com a Casa, o procedimento é mais complexo e num segundo instante envolve permissão do Judiciário. Maycon Freire contou que das 11 crianças que vivem no local, oito são apadrinhadas. Explicou que esse apadrinhamento pode evoluir para a adoção, mas não necessariamente, já que pelo menos metade das crianças, provisoriamente institucionalizadas, contam com grandes chances de terem seus vínculos familiares restabelecidos.
 É isso que se espera: que os pais ou responsáveis tenham condições de permanecer com elas. Maycon Freire contou que D vem desde bebê vivendo em casas de acolhimento da Prefeitura. "Agora com cerca de 12 anos, está em vias de ir morar com a avó no Paraná, onde deverá ser acompanhado pelo Judiciário de lá". Explicou que isso é no sentido de que seus direitos sejam tutelados até que esse novo convívio se consolide e inspire confiança.


(Fonte: PMC)

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